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Ucrânia – O Indispensável Complexo Industrial Militar para Moscou

 

 Nicholle Murmel
Texto baseado em matérias do Moscow Times e Asia Times


 
O ministro da defesa da Rússia, Yury Borisov, declarou na última quinta-feira (19JUN14) que o país pode reduzir em até 95% a importação de tecnologia e peças da Ucrânia até o fim de 2015.
 
De acordo com a agência de notícias ITAR-Tass, durante visita ao complexo naval de Zvezda, na região do Krai do Litoral, no extremo leste, Borisov afirmou que a indústria de defesa russa está progredingo significativamente na nacionalização de componentes críticos, como peças para foguetes, mísseis intercontinentais e aeronaves. O objetivo é que as demandas sejam atendidas pela indústria doméstica.
 
Na semana passada, o presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, anunciou que o país suspenderia a cooperação militar com Moscou. Segundo a ITAR-Tass, a medida afetaria diretamete 79 empresas ucranianas do setor, e 859 companhias russas. As indústrias de defesa dos dois países são fortemente ligadas – resultado da herança soviética comum. Segundo dados da agência de notícias Reuters divulgados em maio deste ano, antes do embargo cerca de 70% de equipamentos militares ucranianos foram exportados para a Rússia.
 
O vice-primeiro ministro interino, Vitaly Yarema, esclareceu o anúncio do presidente Proshenko ainda no mesmo dia, declarando à emissóra ICTV que a Ucrânia “continuaria a cooperar [com a Rússia] apenas em tecnologias de uso “DUAL, emprego tanto militar quanto civil, por exemplo motores para helicópteros”.
 
O vice-ministro da defesa russo, Dmitry Rogozin – czar da indústria de defesa e aeroespacial – respondeu ao anúncio da autoridade ucraniana pedindo a Moscou que acabe com a dependência de componentes fabricados no país vizinho através da nacionalização do desenvolvimento e produção de itens-chave. De acordo com Rogozin, o processo deve levar em torno de dois anos.
 
Rogozin  desconsiderou a gravidade da decisão de Kiev, alegando que na semana anterior Moscou já estava tomando medidas para mitigar os efeitos de um possível embargo proposto pelo vizinho. No dia 17 de junho O vice-ministro escreveu em sua página do Facebook que um plano havia sido enviado para análise do Comitê da Indústria de Defesa, detalhando o que seria necessário para substituir as importações da Ucrânia com produtos nacionais.
 
A dependência russa de componentes é subproduto do colapso da antiga União Soviética. Quando a República Socialista Soviética da Ucrânia se tornou um Estado indpeendente, em 1991, Kiev passou a ter dentro de suas fronteiras instalações vitais do setor de defesa, como as instalações da Yuzhmash, no leste do território, que produzem foguetes e satélites, motores para helicópteros e aviões, além de mísseis e maquinário para uso civil.
 
Ao longo das últimas décadas, a simbiose não foi problema para Moscou, uma vez que Kiev permanecia politicamente leal mesmo após o fim da URSS. Porém, com a deposição do ex-presidente Viktor Yanukovych, em fevereiro deste ano, e a subsequente anexação do território da Crimeia à Rússia, as relações com a Ucrânia atingiram seu nadir pós-soviético.
 
O fabuloso complexo industrial militar ucraniano
 
Apesar do discurso seguro e despreocupado do vice-primeiro ministro Rogozin, a dependência tecnológica e industrial em relação á Kiev é uma realidade enraizada. A transição para linhas de produção domésticas pode estar no horizonte próximo, mas Moscou precisa de garantias.
 
Parece que uma das razões mais importantes da postura permissiva da Rússia em relação aos movimentos separatistas-pró Moscou na Ucrânia é algo pouco debatido na grande mídia. O surpreendentemente bem desenvolvido parque industial-militar ucraniano é crucial demais para que Vladimir Putin abra mão da ingerência sobre o país vizinho, mesmo sob ameaça de sansões. Além disso, boa parte desse complexo produtivo se localiza no sul e no leste do território, o que torna o foco da autoridade russa ainda mais claro.
 
Alguns leitores podem se lembrar da cena do filme-catástrofe 2012, em que um magnata russo dono de uma aeronave gigante carregada de carros de luxo se gabava da origem do avião: “é russo”. Na verdade, era ucraniano – um AN225 Antonov, o maior avião do mundo. A Antonov, com sede perto de Kiev, também criou e fabrica o AN70, uma aeronave de transporte de médio porte, também uma série de planadores como o AN15, um modelo a jato de produção regional (AN18) e uma gama variada de motores. Aliás, o gabinete da Presidência russa conta com duas unidades do AN148-100Es.
 
A Ucrânia também é sede da Motor-Sich, empresa que desenvolve e produz motores para aviões e helicópteros, além de turbinas para sistemas de bombeamento de gãs e petróleo, além de outras aplicações na área de geração de energia. Basicamente, todos os helicópteros das Forças Armadas russas usam motores da Motor-Sich. A companhia ainda fabrica os motores para o caça/treinador Yak 160. Segundo o analista militar Vladimir Voronov, a Rússia tem o plano ambicioso de acrescentar mais mil helocópteros de ataque às suas forças, mas a empreitada se tornaria impossível sem o fornecimento garantido pela Motor-Sich.
 
O vizinho cobiçado por Moscou também conta com uma indústria avançada de desenvolvimento e produção de foguetes e mísseis. A Ucrânia criou, fabricou e ainda hoje presta serviços de manutenção para o principal modelo de mísseis balísticos intercontinentais da Rússia – o temido R-36, ou SS18 Satan pela classificação da OTAN.
 
A Ucrânia ainda abriga o que já chegou a corresponder a 30% da indústria de construção naval da antiga União Soviética, e que continua a prover serviços na área para diversas nações, incluindo a China, a quem o país vendeu o navio-aeródromo Varyag, que a Marinha do Exército de Libertação Popular reconfigurou no recém-comissionado Liaoning.
 
Em uma campanha recente das Forças Armadas russas para aumentar a construção de navios, Vladimir Voronov apresentou parecer atestando que os estaleiros do país não conseguen atender à demanda, forçando Moscou a recorrer cada vez mais a Kiev, que, por sua vez, também é expoente na produção de motores para propulsão naval. Em seu relatório, Voronov concluiu que dos 54 meios de superfície a serem adquiridos pela Marinha russa, 31 seriam equipados com motores ucranianos. Logicamente, a viabilidade do fornecimento desses componentes está comprometida pela decisão do governo ucanano de suspender todos os contratos de venda de equipamentos para  Rússia, por conta da intervenção na Crimeia e de todas as instabilidades subsequentes.
 
Por fim, a Ucrânia também é um grande fabricante de blindados e veículos de transporte de pessoal. O pólo industrial da Cracóvia criou e fabricou os modelos de carros de combate  T34, T54, T64 e T80, e especialistas afirmam que o mais recente, o MBT T84, é mais eficiente que os russos em uso atualmente. O portfólio de armamentos inclui ainda mísseis ar-ar para aeronaves de caça, mísseis superfície-ar, míssies de cruzeiro, além de uma indústria forte de partes e sistemas que atendem a vários projetos militares russos, incluindo o novíssimo caça de quinta geração, em desenvolvimento, o Sukhoi –T-50 PAK/FA.
 
Para Moscou, perder a Ucrânia para a União Europeia, ou pior, para a OTAN, significaria a potencial perda de todo esse aparato industrial, e a necessidade de substituí-lo o mais depressa possível. Há ainda a possibilidade de vazamento de segredos militares possivelmente útieis para os concorrentes da indústria bélica russa.
 
Cientistas e engenheiros ucranianos conhecem vários dos segredos militares russos mais sensíveis, e até mesmo deram origem a alguns deles. Além disso, uma observação rápida em um mapa aponta que a Cracóvia, lar do complexo industrial de blindados e veículos, se encontra no leste do país. O pólo de construção naval está em Mykolaiv, no sul. Já a indústria aeroespacial está em Dnepropetrovsk e a Motor-Schi em Zaporizhia, ambas no sudeste. Esses dados geográficos tornam claro porque são justamente essas regiões da Ucrânia que passam atualmente pelas piores ondas de violência e oposição ao governo em Kiev – oposição instigada pela autoridade russa.
 
O complexo industrial-bélico da Ucrânia é importante demais para Moscou. Sendo assim, talvez sanções não sejam suficientes para Vladimir Putin retroceder.

 

Nota DefesaNet

Era Junho de 2002, conferência de imprensa da Delegação Russa na EUROSATORY.  Com o auditório cheio, os russos fizeram o máximo para impressionar, trazendo inclusive o mítico Kalashnikov em pessoa.

Na oportunidade os russos afirmaram que passariam a adotar o padrão OTAN, por exemplo munições de artilharia no calibre de 155mm substituindo a de 152mm usual desde os tempos da União Soviética , etc. (Nota: fato que passados 12 anos ainda não ocorreu).

Tudo andava bem até um jornalista ucraniano perguntar se a indústria de defesa de seu país estava nos planos apresentados pela delegação russa.

A resposta foi um simples e claro, NÃO !

O editor DefesaNet

 

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